Thursday, October 19, 2006

Bossa Nova à Francesa

Lançado em julho deste ano “Bande A Part” é a mais nova obra-prima realizada sob a influência da Nouvelle Vague francesa. Peço calma a todos! Godard e Truffaut não ressuscitaram, ainda não enlouqueci e o que falo não é criação de gênios, pensadores e críticos da indústria cinematográfica. Assim como Godard e Truffaut reinventaram o cinema a partir de suas obras primas “O Acossado” e “Os Incompreendidos” (ambas de 1959), o coletivo musical francês Nouvelle Vague se dispõe à reinvenção de clássicos do pop/rock mundial, até pouco tempo esquecidos em empoeiradas prateleiras, repletas de arqueológicos vinis.

Liderado por Marc Collin e Olivier Libaux, o projeto parte de uma extensa pesquisa musical e se apóia na sensualidade de um naipe de vozes femininas. A beleza de seus diferentes timbres vocais garante um que de melancolia, à interpretação de músicas rasgadas por ritmo, balanço e sensibilidade bossa-novista.

Lançado em 2004, “Nouvelle Vague” (Peacefrog), o primeiro álbum da banda, despe canções esquecidas do final da década de 70 e da cena New Wave dos anos 80, e as reveste em tratamento acústico, com seções rítmicas saculejantemente brasileiras e harmonias vocais das mais doces. Desorganizando assinaturas e estruturas sonoras de grupos como: The Clash, Joy Division, Depeche Mode, The Cure e Dead Kennedys, estes franceses fazem com que a Nouvelle Vague ou New Wave / Bossa Nova (todas as expressões tem o mesmo significado), soem uma coisa só, numa cuidadosa mescla do DNA sonoro de cada um destes rótulos musicais.

“Bande A Part” (2006 – Peacefrog) segue o mesmo caminho do álbum de estréia. “Desarranja” canções e reencarna mais uma vez seu pop gótico, em versões delicadamente suingadas de: “Heart of Glass” - Blondie, “Blue Monday” - New Order, “The Killing Moon” - Echo and the Bunnymen, “Ever Fallen in Love?” - Buzzcocks e acreditem, “Dancing With Myself” de Billy Idol. Para fãs xiitas a coragem destes franceses poderá soar apenas como uma bizarra ode experimental; aos mais ousados, no entanto, resta a possibilidade de desprendimento em saborosos minutos de deleite musical.

O Cinema e a Nouvelle Vague

Jean Luc Godard e François Truffaut foram os idealizadores de um dos mais famosos movimentos “não oficializados” da Cinefilia, a Nouvelle Vague. Personagens fundamentais e participantes da evolução da produção cinematográfica, Godard e Truffaut se dispunham com paixão a entender, criticar e reavaliar a condição do espetáculo hollywoodiano, desde o tempo em que eram colaboradores da lendária revista parisiense de Cinema, Cahiers du Cinéma, de André Bazin. Porém, as encigarradas redações, máquinas de escrever, papéis e canetas foram postos de lado e trocados pelas ruas e estúdios de Paris. Como idéia de vanguarda, seus filmes e textos são até hoje referências obrigatórias, para estudantes e amantes dos fotogramas convertidos em 7° Arte. Através de suas experimentações a Nouvelle Vague fez surgir uma nova proposição cinematográfica, a partir da qual, o foco principal da obra se “enquadra” em quem a filma, ou seja, nos diretores. E lá estavam Godard e Truffaut, valorizando a assinatura autoral para o cineasta, quebrando paradigmas do cinema clássico, experimentando novas estéticas visuais e abusando de novos conceitos de edição e construção de narrativa.

A Nouvelle Vague das décadas de 50 e 60 além de inspirar cinéfilos, cineastas e amantes da Arte, continua também a influenciar a música em tempos de “pós-modernidade” (qual será a próxima classificação teórica, para a Modernidade? Isso me intriga...). As curiosas releituras realizadas pela banda estão aí para desmistificar concepções musicais, e podem não agradar a maioria de fãs, dos grupos cirurgicamente destrinchados em “Bande A Part”. No entanto, é inegável o quão interessante é a combinação e desestruturação que estes talentosos músicos encenam.


Sob a ótica da “nova” Nouvelle Vague francesa, os líderes do Joy Division e do The Clash não ficam presos em seus “paletós de madeira”. Pelo contrário:

Joe Strummer dança ao som de “Guns of Brixton” enquanto Ian Curtis flutua junto a sua tumba. Num cemitério iluminado por feixes vermelhos de sol que insinuam o crepúsculo, despem suas almas e brilham intensos, numa luminosidade gélida, tal qual um sopro de vento frio que faz arder nossa espinha de ponta a ponta. Desfalecido Strummer é envolto por um coro sutil de vozes, ao passo que Curtis se espalha pelo ar e acena, dando adeus a seu jazigo mortuário. Relutantes a se confinar ambos fazem ecoar, tal qual um sussurro, seu último canto:
O aval da música à liberdade perpétua.

Confira:
http://www.myspace.com/nouvellevague

Wednesday, October 04, 2006

TV On the Radio

Parte I
- E aí. O que tem ouvido de bom?
- Cara, muita coisa.
- Algo surpreendente?
- Hum... Existe algo mais insano, improvável e musicalmente bem trabalhado que Return to the Cookie Mountain? Novo CD do TV On the Radio.
- Quem?
- Bicho, são uns nova-iorquinos que fazem Música.
- E daí, milhões de nova-iorquinos fazem música e em todos os estilos possíveis. Nova York tem de tudo. É o Mundo meu caro.
- Cara. Só posso falar que esses caras são nova-iorquinos e fazem Música.
- Até aí, grandes merdas!
- Se o que falo não te instiga você sai perdendo, e sem notar que na sua questão obteve a resposta que queria ouvir.
- Como assim?
- Quanto pragmatismo. Não consegue enxergar além do óbvio? O que lhe disse e o que você me perguntou já são tudo que podemos falar deles.
- Muito do que, deles quem, cê ta doido?
- É um quinteto de Nova York e o nome do cantor é Tunde Adepimbe. Acabam de lançar um dos ábuns mais bem recebidos pela crítica mundial e vão se apresentar no TIM Festival.
- Ah sim. Agora to entendendo, mas os caras não são americanos? Tunde Ade...o quê?
- Tunde Adepimbe, mas entendendo o quê? Agora não disse nada, ta sacando o quê?
- Ta doidão?!
- Cara, você é aquilo que não consegue ver e ouvir sabia?
- Da boa essa hein! (rsrs) Me passa o contato.
- Você é o cenário musical da atualidade.
- Por que esta me elogiando agora?
- Que elogio?! Disse que o que você enxerga é o reflexo da burocracia musical. E isto não é elogio nenhum. Se o cenário esta assim é porque temos muitas cabeças e ouvidos que nem os seus.
- E isso não é bom?
- Não. É terrível, triste, melancólico. Estou deprimido. Meu grito por ajuda é o seu canto cortejando a irrelevância e o vazio.

- Calma. Calma. Posso te ajudar, conheço um bom analista. Você vai ficar bem.
- Eu quero é ficar mal!
- Senhor! Ajude essa alma a se livrar de seus devaneios!
- Torto, ao contrário, desorientado, perdido. Louco, louco e louco!
- Você ta me levando a loucura! Ajude-me, diz o que tomou. Evoco Freud, se preciso.
- Chame Nietziche, Cioram e Schopenhauer. Os sofistas, filósofos e psicanalistas. A música de hoje é o mundo Poliana. A cegueira da tragédia, do desencanto e do conflito.
- Maníaco! Louco!
- O ser humano é trágico, precisa do sofrimento pra criar.
- Pessimista amador!
- Estão todos sedados, camuflados pela sinestesia anestésica da velocidade, das cores, dos impulsos elétricos, do dinheiro, de tudo que nos rodeia e ninguém mais pensa. Quem pensa é louco, quem não pensa é são, é o paradoxo da sanidade. Você não percebe?
- Diabos! Loucura! Discórdia! Onde você quer chegar?
- Se ficar bem como você, traga o caixão, pois morri. Se não morri, matam-me aos poucos. Sinto o apertar de seus dedos pouco a pouco em meu frágil pescoço, a tênue linha da vida sendo asfixiada por suas palavras! Por efêmeros segundos espasmos convulsivos tateiam a vida e por fim encontram: morte.
- Meu Deus! O que deu em você?
- É o fim da morte, portanto o fim da vida. O apocalipse do instinto. O Carnaval da apatia, do conservadorismo e da comodidade. O transtorno obsessivo compulsivo da preguiça, a covardia da criação e a falência múltipla dos olhos. Você não sente? Não ouve? Não vê?
- O que? Me diz, o quê?
- É a tragédia! É a vida! É Música!
- Hein!!!
- O que você faz aqui parado?!
- Parado?!
- Pra onde você quer ir, porque, pra quê?
- Cara! Eu nasci e to aqui da mesma forma que você! Pra que tantas perguntas? Deus do céu...
- Não! Morre aos poucos sem se dar conta. O tic-tac do relógio está em sincronia com os passos da sua morte. Se desapegue do tempo.
- Você só me perguntou se eu conhecia uma banda. Não imaginava que desencadearia a esquizofrenia alheia! Sinto-me culpado!
- Sim você é o culpado!
- Pelo amor de Deus! Me deixe ir embora!
- Mas quem te prende? Você?
- O quê?!
- Esta com medo de si?
- Que isso?! Até! Até nunca mais!


Parte II
Confuso?

Sim. Ando confuso com a enxurrada de informações que meu cerebelo tenta gratuitamente absorver.
Ontem nasceu mais uma nova invenção da música, apadrinhada pela capa da NME; hoje, o suplente EMO, Panic! At the Disco, esta nos jornais e amanhã, não sei qual outro militante do irrelevo musical arrebatará os charts da Billboard.
Semana que vem, pode anotar! Teremos outras duas, três...e quiçá um leilão. Sim, um leilão! Com tudo que tem direito.

- Dalhe um, dalhe dois, dalhe três!

- Quem dá mais? Quem dá mais?

- Encerrado!

Esbraveja efusivamente o leiloeiro, após acirrada disputa do vazio. E assim, teremos mais dez Elvis Presleys, Beatles, Nirvanas e Bob Marleys banguelas e surrealistas.
É. O mundo ta rápido!

- Descobridor da pólvora. Que percepção e sensibilidade! (Diriam os mais “ironicúsinhos”).


Mas o fato é que nenhuma banda dura mais de meia década. Se acabam na mesma velocidade com que são inventadas e produzidas, para serem o que não são e apresentarem o que não possuem.
Os narcisos musicais ou os Faustos vendedores de alma se fazem e desfazem com o mesmo de
scaso com que levam suas aspirações pessoais e artísticas. São cada vez mais breves seus 15 minutos de fama, a expressão se torna cada vez mais literal.
Ao romântico, ainda resta uma pergunta:

- Onde foi parar meu “Rock n`Roll”?!

- Na puta que te pariu!!! (Diria minha atual consciência).

Mas to nem ai, se existir sempre um TV On the Radio.
Afinal, estou aqui pra falar destes negões e um branquelo de Nova York que desenham e constroem musicas cinematográficas e brincam com casamentos sonoros improváveis. É o bom acabamento da loucura, se é que isto é possível.
Provam que sim, e nos mergulham de cabeça no emaranhado musical que representam.

- E o que eles representam? (Perguntaria nosso assustado personagem)
- Sinceramente, sei lá e veementemente não quero saber.



Basta o que nos oferecem: a possibilidade de deslizar como fumaça dispersa e flexível, na leveza de seus milhões de movimentos musicais.
Se estrebuchar com o single “Wolf Like Me”, submergir na catarse sensorial de “Staring at the Sun” e assistir a sutileza brutal de “Province” e “I Was a Lover”.

O Palco Club do TIM Festival os aguarda no próximo dia 28. Logo após o suicídio musical: Bonde do Rolê (que abrirá a noite). Teremos enfim redenção.
Duas bandas tão distintas dividindo o mesmo espaço é ter o céu e o inferno, o feio e o belo, o que há de pior e melhor no mundo da música. Por fim, a olhos nus, poderemos observar concretamente uma subjetiva antítese musical! Tudo que a modernidade nos possibilita de maneira viva. Bandas que saem da internet e outras que ainda optam por viver de Arte.

Confira: http://www.myspace.com/tvotr